quinta-feira, 8 de julho de 2010

Este post foi escrito por uma mulher. Que não se espere coerência ou objectividade.

Dançam-me no olhar imagens do fumo a desaparecer devagar nos contornos das noites que passei acordada à janela com o cigarro na mão. Procurava desaparecer com o fumo, misturar-me com a noite. O candeeiro de luz amarelada iluminava a magnólia e tingia de ouro as flores brancas. E eu sentia-me especial, porque poucas pessoas se estariam a sentir tão destruidas como eu, e isso também é ser especial. Houve dias em que juntava um copo de vinho ao cenário, e nesses dias podia morrer porque era bonito encontrarem com o corpo um copo de vinho meio bebido, uma garrafa vazia e um cinzeiro a abarrotar de beatas.

O sofrimento é belo. Na arte, enquanto elemento estético, a dor é incontornável. Na vida não. Por opção ou postura perante a vida, não.

Há aquele estereótipo do artista, despenteado e bêbado, com o cigarro numa mão e a caneta na outra, numa mesa qualquer de um café rasco com esplanada. No caderno deitado na mesa, palavras ou traços.

Ao artista perdoa-se tudo, pode tratar mal a mulher, ou cuspir no chão, pode não pagar a renda e dizer asneiras, pode fumar droga ou injectá-la nas veias, ou fazer aquilo que lhe passar pela cabeça, como ter sexo com uma prostituta, ou com duas ou com três ou com homens, ou com todos ao mesmo tempo.

Ao artista perdoa-se tudo, porque ninguém o compreende, e nem tenta, porque não se chega lá. O artista é um génio, logo tem de estar desiludido com a sociedade medíocre, tem de rejeitá-la e gozar com a cara dela. Não tem tempo nem paciência nem disponibilidade para se deixar surpreender. Isso significaria estar aberto e pelas aberturas podem entrar correntes de ar que tirem as coisas do sítio onde estão, tão bem arrumadinhas.

Não percebo quando é que a felicidade passou de moda. Não compreendo porque é que as pessoas deixaram de utilizar a inteligência e a criatividade para viver, com mais significado. Achar que a vida não tem mais nada para nos inspirar é estúpido. Ser passivo-deprimido-céptico-ou-o-raio-que-o-parta não é moderno, é cobarde.

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