quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Galeria Talho

É preciso contextualizar: Um talho feito galeria, um fumeiro feito armazém, duas telas feitas origem. O desperdício enquanto conceito.
Visitei a exposição de inauguração da galeria de um conhecido, sabendo apenas que o espaço era um talho, que funcionava como tal alguns dias por semana.

Só pode ser uma mais valia cruzar um espaço (talho) com uma temática aparentemente díspar (arte). A aparente desconexão estimula a interligação de conceitos, numa experiência de laivos sinestésicos.
Na arte deixei de procurar a obra, procuro a experiência. A obra existe, mas como elemento, não como finalidade. 


A dada altura da visita, chega uma velhota. Conta as suas histórias e no final deixa um pão caseiro, cozido nessa manhã, e um pacote de manteiga, “para engordar as cachopas”, justifica-se, rasgando um sorriso malicioso, num rosto que carrega nos olhos a profundidade dos anos.

É a vertente não planeada que acaba sempre por me envolver. O espaço para o acidente/incidente. Toda a experiência se enaltece perante o acaso, ou não fosse o plano a antecipação de uma experiência, constrangendo assim a percepção da mesma. A expectativa mata tudo. O imprevisto, enquanto potenciador da experiência, é imensurável.

Neste caso, fazer de um talho galeria já trazia em si um quase acidente, a sensação de desencaixe que possibilita infinitos encaixes, pelo espaço que existe para eles.

É exactamente essa a função da arte para mim, que me tire de um sítio e me leve para outro, que me faça mexer, relacionar, estabelecer pontes. 

No final, encontrei exactamente aquilo que procuro aquando de uma experiência estética, alguma desconstrução, e a quebra de lugares comuns.

p.s.: não era por aqui o objectivo do post, mas não resisto a comentar a beleza improvável da dicotomia carne/arte, enquanto alimento físico/metafísico.





terça-feira, 18 de outubro de 2011

Os cuidados na formatação de texto

“Chegamos assim à hora da verdade sendo necessário tomar medidas de fundo que assegurem uma consolidação sustentada das finanças públicas.”
in Relatório OE2012 



Não me perguntem porquê, mas assim como quem não tem nada melhor para fazer, fui dar uma vista de olhos ao relatório do Orçamento de Estado para 2012. Li o que li na diagonal, não é uma leitura muito apelativa(passe o eufemismo). Chamou-me no entanto a atenção o detalhe (passe outro eufemismo) acima. A hora da verdade como sendo a única expressão no documento inteiro a negrito sublinhado. (Sim, que não tendo lido o documento completo, scrollei-o todo. (Hei-de ler aos poucos, naquelas meias-horas.))

Passe o tom determinado a arranhar o pré-apocalíptico e fiquei sem saber muito bem o que significava aquilo. Será que até agora tem sido tudo mentira? ou mais estranho ainda, que a partir de agora será diferente? Ainda passeei o rato pelas palavras em questão na esperança de um link que me explicasse o que era afinal a hora da verdade. É que estes conceitos vagos estão um bocadinho fora do meu alcance rude de portuguesa do interior. O tempo é aquela coisa que se diz que é psicológica (as coisas psicológicas são sempre muito complicadas), e neste caso, a hora parecerá a todos muitos anos, suspeito. Quanto à verdade, pior ainda, ninguém sabe muito bem o que significa, e há até quem diga que cada um tem a sua. Ainda assim, é possível que descanse as pessoas, mesmo que não se saiba muito bem o que é, diz-se dela que é boa.


Para terminar, devo elogiar o cuidado. A verdade, num documento de estado, não fosse ela sublinhada e a negrito, passaria certamente despercebida.

p.s.: Ao contrário do relatório em causa, este texto é redigido ao desabrigo do novo acordo ortográfico.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Curtas VI

A ganância é uma questão de oportunidade. Os ricos não são mais gananciosos que os pobres. Têm é mais oportunidades.